
A saída de Deus e a chegada do mal
“Agora,
pois, vos farei saber o que eu hei de fazer à minha vinha: tirarei
a sua sebe, para que sirva de pasto; derrubarei a sua parede,
para que seja pisada; E a tornarei em deserto; não será podada
nem cavada; porém crescerão nela sarças e espinheiros; e às nuvens
darei ordem que não derramem chuva sobre ela.” (Isaías 5:5-6).
Plantar uma vinha (hebr. “kerem”) na terra de Israel era algo trabalhoso. Começava na escolha
de um local alto, geralmente na encosta de uma colina para favorecer a vigilância
(Jeremias 31:5). Sua implantação envolvia preparativos e trabalhos árduos desde a
retirada das pedras até a edificação da sua estrutura básica: construção de
cerca, da torre de vigia e de lagar talhado na rocha para esmagamento das uvas
(Mateus 21:33). O lagar é a prova da grande confiança e expectativa de bom
resultado com que se planta uma vinha, pois nele passará todos os frutos bons
que trará alegria ao dono, esperança concretizada pelo vinho que alegrava os
corações.
Na parábola dos lavradores maus contada por Jesus a
expectativa de frutos consistia no pagamento da renda da vinha (Mateus 21:34),
confirmando que somente ficaremos na vinha se formos bons e zelosos em cumprirmos
o pacto ou aliança que fizemos com o Senhor, bem como confirma também nossa
vocação para a produção de frutos espirituais porque somos filhos da luz do Espírito
que habita em nós – “(Porque o fruto do
Espírito está em toda a bondade, e justiça e verdade);” (Efésios 5:9).
Depois de tudo isso, o trabalho com as podas da vide era
permanente (Levítico 25:3) e esperava-se anos para a primeira colheita, algo tão
importante em Israel que durante o tempo entre o plantio e a primeira colheita
o dono da vinha estava dispensado do serviço militar (Deuteronômio 20:6), pois a vinha
produtiva era símbolo das bênçãos de Deus – de fato, não é comum uma planta
produzir frutos num solo rochoso, com pouca água. Igualmente, a vinha destruída
ou minguada apontava para a reprovação e juízo divino sobre o povo por causa da
desobediência aos mandamentos da lei (Deuteronômio 28:30, Isaías 16:10).
Aqui o Senhor está usando a analogia de alguém que plantou
uma vinha, cercou o local com uma sebe para proteger dos ataques dos animais, a
fim de dizer o que faria à nação de Israel, o povo que ele resgatou da escravidão
do Egito e o plantou na terra onde habitavam os cananeus (Salmos 80:8-9). A vinha
frutificou, tornou-se próspera e depois degenerou-se, como se fosse uma vide
brava, produzindo frutos ruins (Jeremias 2:21). Somos ensinados que uma vinha se
degenera quando nela é semeado diferentes espécies de semente (Deuteronômio 22:9),
mistura que enfraquece a vide e depois põe a perder sua novidade ou a qualidade
dos frutos produzidos.
Da mesma maneira a Igreja precisa semear só uma semente: a
palavra da verdade do evangelho de Cristo, cuja mensagem principal é o
arrependimento e a remissão de pecados pela fé em Cristo (Lucas 24:47), anunciando
que Jesus ressuscitou da morte, vivo está à destra do Pai e voltará para buscar
sua Igreja (I Ts 4:16-17). Este é o nosso trabalho na vinha do Senhor, pois a
semente da verdade produz frutos por si só.
O profeta Isaías está dizendo que Deus desde o momento que
libertou Israel do Egito ele o plantou como uma vinha sua – “Porque a vinha do Senhor dos Exércitos é a
casa de Israel, e os homens de Judá são a planta das suas delícias; e esperou
que exercesse juízo, e eis aqui opressão; justiça, e eis aqui clamor.” (Is
5:7) -, com a qual o Senhor teve grande zelo e trabalho à espera de que
produzisse frutos, principalmente proclamando sua lei e vontade às demais
nações, porém não foi isso que aconteceu, porquanto Israel ensoberbeceu e
corrompeu-se com outras sementes deixando de cumprir o propósito divino, pois
deixou o temor e a obediência à lei.
O Senhor havia feito tudo que se podia fazer para uma
vinha produzir, contudo a mesma em vez de produzir uvas boas produziu uvas
bravas, deixando-o decepcionado – “Que mais se podia fazer à minha vinha, que
eu lhe não tenha feito? Por que, esperando eu que desse uvas boas, veio a dar
uvas bravas?” (Isaías 5:4). Uvas bravas ou amargas simbolizam os frutos
espirituais inúteis produzidos por pessoas que desprezam a palavra e a presença
de Deus.
Isaías pregava essa parábola para Judá, nação que há pouco
tempo tinha visto a destruição de Israel (reino do Norte) por causa da
desobediência a Deus, pois deixaram os caminhos do Senhor para seguir e adorar
deuses pagãos, contudo Judá não se corrigiu e estava andando pelos mesmos
caminhos de Israel, o que também atraiu o juízo divino – “Agora, pois, vos farei saber o que eu hei de fazer à minha vinha:
tirarei a sua sebe, para que sirva de pasto; derrubarei a sua parede, para que
seja pisada;” (Isaías 5:5).
Quando Deus retira de sobre nós o seu olhar por causa da desobediência tudo se torna infrutífero e cessam suas bênçãos – “e às nuvens darei ordem que não derramem chuva sobre ela.”, o que é catastrófico para qualquer alma, pois como se viverá sem paz, alegria, proteção e o amor de Deus?
O apóstolo Paulo alerta a Igreja a não imitar a geração de israelitas que peregrinou pelo deserto, a qual por causa da desobediência perdeu o direito ao descanso que Deus havia preparado – “Vede, irmãos, que nunca haja em qualquer de vós um coração mau e infiel, para se apartar do Deus vivo.” (Hebreus 3:12).
A misericórdia de Deus é o motivo de nós não sermos
consumidos. Ele sempre avisa o povo por meio de profetas antes de enviar
calamidades e juízos (Amós 3:7) e assim agiu com a rebelde Judá, avisando-lhe da
iminente retirada da cerca e derrubada da parede que a circundavam, símbolos da
proteção divina. Quando Deus retira sua proteção de alguém ou lugar o desastre
é gigantesco porque o inimigo vem pra cima com toda sua força destrutiva e a
vinha é “pisada” e vira “pasto”.
Uma das perguntas clássicas que fazem acerca de Deus é se
ele também criou o mal. No capítulo 45:7 de Isaías o Senhor diz “eu crio o mal”, contudo na língua
hebraica a melhor tradução para a palavra “mal”
(hebr. “ra”) é calamidade ou
adversidade, o que se harmoniza com o contexto da passagem, no qual a
calamidade ou adversidade mencionada era permitir que as nações inimigas
viessem destruir Israel.
O estado de calamidade (hebr. “ra”) consiste em estar
suscetível ao poder do mal por falta de proteção divina. É uma condição de
adversidade e desamparo espiritual, vez que as forças
malignas encontram abertas
as portas para atormentarem e destruírem
impiedosamente os que não mais têm a proteção divina. Ou seja, Deus não cria o mal
em essência, mas permite ou autoriza indiretamente suas consequências afastando
de pessoas ou nações, ausência que atrai a escuridão das trevas, ao tempo que
libera a ação do poder do mal pela falta da presença da luz divina. A Bíblia,
por diversas vezes, diz não haver neutralidade espiritual; ou se está com o bem
ou com mal.
A mensagem é
clara: Sejam pessoas ou igrejas fomos plantados nesta terra por Deus com a
expectativa de produzir bons frutos espirituais, por meio da justiça da fé na
obra redentora de Cristo. Mas, se contrariarmos essa vontade do dono da vinha
ele retirará a proteção concedida – o Espírito Santo – visto que o Senhor não
permanece onde há pecados (Isaías 59:2), o que é uma forte exortação à obediência e
à vida santa para não sentirmos as consequências amargas da vida que se afasta de
Deus.
Está
demonstrado nas Escrituras que todo convertido tem uma cerca e uma parede
protetora ao redor da sua vida – “Pois
eu, diz o Senhor, serei para ela um muro de fogo em redor, e para glória
estarei no meio dela.” (Zacarias 2:5), que é o Espírito Santo derramado no
coração dos santos e pelo qual fomos selados como propriedade de Deus (Romanos 5:5,
Efésios 1:14).
Portanto, o
mal chega e entra impiedosamente em alguém quando se vive só para si mesmo,
pelas próprias forças físicas ou natureza carnal, desprezando a palavra de
Deus. Aconteceu com Israel, Judá não se corrigiu e também perdeu a proteção
divina. Indaga-se: Aprendemos esta lição ou vai ocorrer conosco?
Senhor, tenha misericórdia e não permita que jamais
venhamos a se afastar da verdade e da glória que há em Cristo Jesus, nosso
Senhor e Salvador!