
“Não me deram ouvidos, nem inclinaram os seus ouvidos”
“Mas isto lhes
ordenei, dizendo: Dai ouvidos à minha voz, e eu serei o vosso
Deus, e vós sereis o meu povo; e andai em todo o caminho
que eu vos mandar, para que vos vá bem. Mas não ouviram, nem inclinaram
os seus ouvidos, mas andaram nos seus próprios conselhos, no propósito
do seu coração malvado; e andaram para trás, e não para diante.”
(Jeremias 7:23-24).
Importante enfatizar que o verbo ouvir (hebr. "shama") no
hebraico tem o sentido de obedecer porque ambos os verbos possuem a mesma raiz
linguística. É por isso que Isaías diz “ouvi a palavra do Senhor, os que
tremeis da sua palavra” (Isaías 66:5),
pois obedecer estava implícito no verbo ouvir. Coisa maravilhosa! Na
antiguidade não se concebia que o homem pudesse ouvir e não obedecer a palavra
do Deus Altíssimo –
em hebraico “El Elyon”, nome
geralmente usado pelos gentios ao falarem do Deus Supremo ou do Deus dos deuses
referindo-se ao Senhor Deus. Por exemplo, o sacerdote Melquisedeque
abençoou Abraão em nome do Deus Altíssimo quando retornou da
vitória sobre o exército comandado por Quedorlaomer, rei de Elão (Gênesis 14:18-20).
No texto em destaque (Jr 7), o Senhor Deus ordenou ao profeta Jeremias
que fosse à porta do templo em Jerusalém falar ao povo que não adiantava entrar
e sair do templo dizendo “templo do
Senhor, templo do Senhor, templo do Senhor é este” (Jeremias 7:4), como fazem
pessoas que têm um amuleto ou superstição nos quais confiam, pois eram fúteis e
vazios os sacrifícios que ali ofereciam em nome de Deus, porquanto lhe
prestavam uma falsa adoração vez que também adoravam deuses pagãos e não se
arrependiam de seus pecados. O comparecimento ao templo era mero ritual, sem
temor nem vontade de obedecer a palavra de Deus, daí serem alertados pelo
profeta que da mesma maneira como o Senhor tinha destruído o santuário de Siló
também destruiria o formoso templo que eles tanto gostavam de frequentá-lo por
mera religiosidade (Jeremias 7:14).
Eles estavam sacrificando e ofertando no altar do templo, sem, contudo,
se comprometerem moralmente e viverem conforme a vontade de Deus. Faziam o
sacrifício de tolo (Eclesiastes 5:1). Todo aquele que assim agir terá retrocesso
espiritual em tudo que fizer: “e
andaram para trás, e não para diante.”, situação que caracteriza a
vida de crentes secos e destituídos das bênçãos divinas, o que se agravará se o
ministério que frequentam também não tem como primazia o ensino e a pregação
contínua da palavra de Deus. Isso mesmo, a miséria espiritual pode ser uma
decisão pessoal, não da igreja que alimenta o rebanho com a palavra de Deus, ou
de ambos.
O comparecimento à igreja – “os que
entrais por estas portas, para adorardes ao Senhor” - jamais deve ser mais importante do que a
essência da fé em Cristo, pois será pela força da fé que teremos comunhão,
proximidade com Deus e vontade cada vez maior de permanecer na sua presença. O
Senhor não aceita culto sem obediência nem fé obediente. A ida à igreja é
somente uma parte do conjunto de atitudes e práticas diárias que fazemos na
vida piedosa em busca de comunhão com Cristo.
O Senhor disse-lhes que não adiantava ter uma vida sem temor no dia a dia, dando um testemunho público ruim porque a conduta sempre vai conforme a crença do coração, e em dia de culto apresentar-se diante do altar bem vestido e comportado – “Tu, pois, não ores por este povo, nem levantes por ele clamor ou oração, nem me supliques, porque eu não te ouvirei. Porventura não vês tu o que andam fazendo nas cidades de Judá, e nas ruas de Jerusalém?” (Jeremias 7:14-15).
Nesse ínterim, o Senhor
faz lhes uma pergunta retórica: Quem se prejudica quando o homem se afasta de
Deus, quando perde sua luz e proteção para andar neste mundo? E, responde ser o
próprio homem porque perde a identidade de filho de Deus no mundo espiritual,
passando a ser alvo indefeso dos ataques das trevas: “Acaso é a mim que eles provocam à ira? Diz o Senhor, e não a si mesmos,
para confusão dos seus rostos?” (Jeremias 7:19). Ser confundido é ser
envergonhado pelo poder maligno juntamente com os demais ímpios, por não mais
ter em sua alma a marca do Espírito Santo.
Quando o homem não dá
ouvido às palavras divinas passa a andar por seus próprios pensamentos – “andaram nos seus próprios conselhos” -, o que sempre constitui
uma decisão errada, sua vida entra novamente nas trevas, porém Deus respeita a
escolha de sua vontade – “Mas o
meu povo não me quis escutar a voz, e Israel não me atendeu. Assim, deixei-o
andar na teimosia do seu coração; siga os seus próprios conselhos.” (Sl
81:11-12). Em outras palavras, o Senhor diz: “Vá, segue seu caminho, mas quando as coisas apertarem lembra-se que andar
sem mim foi uma decisão sua!”.
No meio dessa intensa rebeldia espiritual vivida pelas cidades de Judá e
pelos moradores de Jerusalém, Deus manda o profeta dizer ao povo: “Maldito
o homem que não escutar as palavras desta aliança, que ordenei a vossos pais no
dia em que os tirei da terra do Egito, da fornalha de ferro, dizendo: Dai
ouvidos à minha voz, e fazei conforme a tudo quanto vos mando; e vós sereis o
meu povo, e eu serei o vosso Deus.” (Jeremias 11:3-4). Fica claro que o rebelde não quer obedecer nem
ouvir a palavra da verdade. Noutras palavras, foi-lhe dito que ele continuava
sendo Deus, porém o povo da aliança no monte Sinai não mais tinha as bênçãos
prometidas e havia perdido a condição de “povo
de Deus” porque não escutava mais as palavras da aliança celebrada com seus
pais.
Tal passagem explica para muitos a razão pela qual às vezes frequentamos
igrejas, cultos e outros eventos religiosos, porém não somos abençoados, pois
viu-se que embora o povo de Judá comparecesse regularmente ao templo, por causa
da guarda do sábado, para fazer orações, Deus não o considerava mais como seu
povo, devido aos pecados da idolatria e da rebeldia espiritual. Era uma fé
fingida, fraca e sem compromisso com aquilo que era ordenado pela palavra
divina. Jeremias foi mandado pregar as palavras de Deus nas cidades de Judá e
nas ruas de Jerusalém dizendo a eles: “Ouvi as palavras desta aliança, e
cumpri-as.” (Jeremias 11:6), na esperança de que
se voltassem novamente para o Senhor.
Ouvir sem disposição de coração para cumprir ou obedecer tem o mesmo
efeito prático de não ouvir, justamente o que faziam os judeus que frequentavam
o templo em Jerusalém porque ao saírem pelas portas da casa do Senhor praticavam
pecados abomináveis. Ao deixar de ouvir e de inclinar os ouvidos à voz de Deus
os homens fazem tudo conforme os desejos e propósitos do coração malvado (Jr
7:8), apartando-se do Deus vivo.
Jesus ensinou que toda indiferença e a rebeldia
espiritual ao chamado do evangelho será cobrada no final dos tempos (Mateus 22:3-6).
Também somos instruídos que toda rebeldia
rompe a comunhão com o Espírito Santo e com as coisas do reino de Deus, de nada
adiantando cumprir ritual religioso público se não houver arrependimento pessoal
sincero.
O evangelho de Cristo transborda graça e verdade, amor e misericórdia, apeguemo-nos
a ele com obediência “porque este é o amor de Deus: Que guardemos
os seus mandamentos; e os seus mandamentos não são pesados.” (I
João 5:3).