
Ananias e Safira: Eles morreram por qual pecado?
“Guardando-a não ficava para ti? E, vendida,
não estava em teu poder? Por que formaste este desígnio em teu coração? Não
mentiste aos homens, mas a Deus. E Ananias, ouvindo estas palavras, caiu
e expirou. E um grande temor veio sobre todos os que isto ouviram. E,
levantando-se os moços, cobriram o morto e, transportando-o para fora, o
sepultaram.” (Atos 5:4-6).
Há grande
discussão e vários entendimentos entre os estudiosos bíblicos acerca da causa
da morte de Ananias e de sua esposa, ocorrida diante do apóstolo Pedro, líder
da Igreja Primitiva, temporalmente logo após a morte e ressurreição de Jesus
Cristo e o início da organização da Igreja em Jerusalém. Uma das principais
interpretações que existe sobre o assunto é aquela que vê na morte de Ananias (hebr. “Ananyah”), nome hebraico que significa “Nuvem (proteção) do Senhor”, e de Safira (hebr. “Safiyr”), que quer dizer “Pedra preciosa”, uma punição divina pelo
não pagamento de dízimos aos apóstolos, contudo esse argumento deve ser
rejeitado por falta de suporte contextual e teológico.
Em nenhum
momento o texto refere-se a dízimos, mesmo porque naquela época quem pagava
dízimo em cumprimento da velha aliança o fazia entregando a décima parte do que
sua terra e os animais produziam (Levítico 27:30-32 e Números 18:21-26, II Cr
31:4-5, Hebreus 7:5).).
Não se entregava dinheiro em espécie como estavam fazendo os recém-convertidos
ao cristianismo, propagado principalmente pelos apóstolos de Jesus Cristo, mas,
como já dito, o dízimo de dez por cento era tirado de todo cereal colhido nos
campos e dos animais.
O texto diz
que a causa da morte do casal foi a mentira – “Guardando-a não ficava
para ti? E, vendida, não estava em teu poder? Por que formaste este desígnio em
teu coração? Não mentiste aos homens, mas a Deus.” (Atos 5:4) - certamente referindo-se a um voto feito que consagrou (“santificou”) ao
Senhor a herdade [propriedade] vendida – “E quando alguém santificar
a sua casa para ser santa ao Senhor, o sacerdote a avaliará, seja boa ou seja
má; como o sacerdote a avaliar, assim será. Mas, se o que a santificou resgatar
a sua casa, então acrescentará a quinta parte do dinheiro sobre a tua
avaliação, e será sua.”
(Lv 27:14-15), solenidade que era algo sério por ser um voto
feito diante do sacerdote de Deus, razão pela qual a lei advertia “não
profanareis as coisas santas dos filhos de Israel, para que não morrais.” (Números 18:32).
A feitura de voto com Deus é um compromisso
espiritual que impõe grande responsabilidade: “Melhor é que não votes do que votares e não
cumprires.” (Eclesiastes 5:5). Também é dito ser um laço [de morte] para o homem
apropriar-se do que é santo, e só refletir depois de feitos os votos (Pv
20:25).
O apóstolo
diz expressamente que a mentira – usou o verbo mentir (greg. “pseudomai”) - e a retenção de parte do
dinheiro obtido com a venda do imóvel era uma obra de Satanás no coração deles.
Satanás também usou a sedução do dinheiro para entrar no coração de Judas,
levando-o a trair Jesus (Lucas 22:3-5). Ananias e Safira poderiam não cumprir o
voto e ficarem com o valor total do preço da venda. Mas, quando Ananias e
Safira decidem concordemente enganar os apóstolos, homens cheios do Espírito
Santo, tornaram-se servos de Satanás e receberam a punição de Deus, pois “o ímpio é derrubado pela sua malícia;” (Provérbios 14:32 - AA).
Com certeza, o dom
de discernimento de espírito (I Co 12:10) que estava sobre Pedro permitiu-lhe
ver a mentira e a tentativa de engano, sem precisar dar mais tempo para
comprovar a fraude. A mentira foi severamente
punida porque naquele momento o Espírito Santo dirigia a fase inicial da igreja
primitiva, oportunidade que todos os convertidos que tinham herdades (fazenda,
propriedade rural) e casas vendiam seus bens e entregavam o valor do preço aos
pés dos apóstolos. A Bíblia diz que “todos”
faziam isso (Atos 4:34), uma espécie de voto coletivo dos convertidos a Cristo
que permitia os apóstolos suprirem os necessitados e ajudar os que eram
perseguidos pelos judeus. Era algo sobrenatural que dominava os corações dessas
pessoas.
Aquele viver comum ou comunitário (greg. “koinos”)
entre cristãos era protegido pela presença do Espírito Santo (Atos 4:34-35). Mas, o casal tentou enganar os
apóstolos ungidos pelo Espírito Santo que dirigiam a obra de Deus e por isso a
hipocrisia deles foi condenada com a pena de morte. A avareza tomou-lhes o
coração. No entanto, Barnabé fez o mesmo voto e trouxe o preço da venda e o entregou
aos pés dos apóstolos (Atos 4:36-37).
A morte do
casal avarento causou um grande temor em toda igreja (Atos 5:11). Pergunta-se:
Deus mataria alguém como matou Ananias e Safira. A resposta é sim. No livro de
Gênesis, um homem chamado Er, primogênito de Judá, foi morto pelo Senhor porque
era mau aos seus olhos (Gênesis 38:7). Nadabe e Abiú também foram mortos
tragicamente porque não cumpriram o voto sacerdotal (Levítico 10:1-2:30-31). São
poucas as intervenções desse tipo sobre o homem pecador, mas existem. É um
claro aviso da seriedade que é fazer e participar da obra de Deus, pois não se
trata de um negócio mundano, mas de verdadeiro chamado para semear a palavra e
colher almas para o reino de Deus.
Mentir é
afeiçoar-se ao que é maligno, com aquilo que procede de Satanás, o pai da mentira,
pois “quando ele profere mentira,
fala do que lhe é próprio, porque é mentiroso, e pai da mentira.” (João 8:44), conduta que aumenta de
gravidade se feita no meio da igreja do Senhor, por causa da presença do
Espírito Santo. O crente revestido da nova criatura ordena sua vida pela
verdade, justiça e santidade, “por isso
deixai a mentira, e falai a verdade cada um com o seu próximo; porque somos
membros uns dos outros.” (Efésios 4:25).